quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Auto-estima: um tema em questão

Um dos temas mais frequentes abordados pelos pacientes nas sessões de psicanálise é a maldita auto-estima. Criaturas fantásticas em todos os sentidos sofrem desesperadamente por não acreditarem em si, por se sentirem eternos perdedores, por substimarem à própria capacidade de pensar, por se sentirem mal amados, desprezados, não reconhecidos, um caos emocional. Diagnosticado o problema, o psicanalista percorre um longo calvário para elevar a auto-estima do condenado ao suplício do auto-desprezo. Esse é um sentimento atávico que o homem carrega desde sua origem, difícil de ser superado.

Não obstante a via crucis daqueles que padecem desse mal, se creem em Deus, deveriam agradecer de joelhos. A baixa auto-estima é a grande dádiva divina para o homem se proteger de si mesmo.

Quem já conviveu com portadores de auto-estima nos pícaros da lua? Dá pena, não? São esses elementos os grandes colecionadores do detestável "pagar mico". Perdem inteiramente a auto-crítica e o senso do ridículo. Em geral sofrem de incontinência verbal ao grau máximo, são idólatras de si mesmos, a subjetividade é a fronteira inabalável de sua existência, cantam aos quatro pontos cardeais suas proezas e conquistas, se veem belos e irresistíveis, confundem a ordem do público com a ordem do privado, são amados incondicionalmente por todos, emitem opiniões brilhantíssimas e irrefutáveis, são invulneráveis às desditas da vida. Um assombro!

O fato é que a sorte de ter uma "invejável" auto-estima, não descarta a ação de uma força poderosa que conspira permanentemente contra essas criaturas, a vaidade. Esses seres incautos pavimentam seu destino na estrada da oligofrênia e por isso mesmo não se dão conta que são o objeto do escárnio e da pilhéria pública. Não se pode perder de vista que existem dois mundos, o visível e seu contrário. Esse último, o invisível, é o real, o outro é pura representação. Nós não temos o controle sobre o OUTRO e nesse caso não há lugar para polêmica e não é um sofisma. É a arrogância dilatada ao extremo, que leva certas pessoas à exposição pública desempenhando um papel triste com maestria vida afora.

Quem te garante que seu filho encantador não seja um traficante empedernido? Que seu aluno cordato, com ares de admiração, te considere um mestre? Que sua empregada há 20 anos não te roube um pouco a cada dia? Que as declarações de amor são a expressão de um sentimento verdadeiro? Que os elogios não sejam meras palavras? Que seu namorado só o é a sua frente? Que seu pai seja o machão que se apresenta? Que na virada da esquina aquele que estava sob seus olhos, seja a mesma pessoa? Que enquanto você agoniza, alguém comemore?

A certeza sobre o OUTRO só a tem aqueles que não saem da jurisdição de si próprio e acabam caindo na órbita do riso do OUTRO ou dos OUTROS o que é bem pior. Mas ainda assim saem ganhando, porque a estupidez e a cegueira são irmãs siamesas.

Cuidado com a pegadinha. As manifestações de uma alta auto-estima podem ser uma farsa para escamotear uma auto-estima zerada. Não tem saída, para qualquer lado que se ande a indiosincrasia de cada indivíduo garante sua singularidade. Mais uma vez, nem sempre o que se vê se é.

Um comentário: