quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Meu único delito Vingança I



Venha, descerei meu corpo sobre o seu como nunca o fiz antes. Não diga palavras de amor, não gosto de ouvi-las, já as conheço. Quero apenas te mostrar o quanto posso te ser útil. Tirarei sua roupa, peça por peça, passarei a língua em todas as partes de seu corpo como se não existisse o amanhã. Você ficará imóvel, hoje quem comandará o espetáculo serei eu. Venha.

Ele foi. Entrou poderoso pela porta pensando, as mulheres sempre cedem, estava certo. Ela o esperava hirta de desejo. Com o coração em corrida o abraçou e o beijou apaixonadamente. Na sala coberta de tapetes empoeirados ela o jogou ao chão e cumpriu a promessa. Seu corpo esguio, pronto para o deslizamento, percorreu o corpo dele, cada centímetro foi delicadamente violado.

Imóvel ele não sabia se chorava ou ria de prazer. As mulheres sempre cedem, continuava pensando, sonhando. A dado momento ele abriu os olhos em orgasmo e falou, morri. Ela respondeu sorrindo, sim morreu.

Quando o sangue começou a tingir o tapete ela levantou, foi à eletrola, colocou Wagner, cuspiu sobre o cadáver e pensou: meu único delito foi nascer judia, seu único delito foi escolher ser nazi. Em estado de graça ela foi fazer outra ligação. "Venha"....

Alemanha,dezembro de 1945.

A vingança pode ser feita de várias formas, é só escolher.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Auto-estima: um tema em questão

Um dos temas mais frequentes abordados pelos pacientes nas sessões de psicanálise é a maldita auto-estima. Criaturas fantásticas em todos os sentidos sofrem desesperadamente por não acreditarem em si, por se sentirem eternos perdedores, por substimarem à própria capacidade de pensar, por se sentirem mal amados, desprezados, não reconhecidos, um caos emocional. Diagnosticado o problema, o psicanalista percorre um longo calvário para elevar a auto-estima do condenado ao suplício do auto-desprezo. Esse é um sentimento atávico que o homem carrega desde sua origem, difícil de ser superado.

Não obstante a via crucis daqueles que padecem desse mal, se creem em Deus, deveriam agradecer de joelhos. A baixa auto-estima é a grande dádiva divina para o homem se proteger de si mesmo.

Quem já conviveu com portadores de auto-estima nos pícaros da lua? Dá pena, não? São esses elementos os grandes colecionadores do detestável "pagar mico". Perdem inteiramente a auto-crítica e o senso do ridículo. Em geral sofrem de incontinência verbal ao grau máximo, são idólatras de si mesmos, a subjetividade é a fronteira inabalável de sua existência, cantam aos quatro pontos cardeais suas proezas e conquistas, se veem belos e irresistíveis, confundem a ordem do público com a ordem do privado, são amados incondicionalmente por todos, emitem opiniões brilhantíssimas e irrefutáveis, são invulneráveis às desditas da vida. Um assombro!

O fato é que a sorte de ter uma "invejável" auto-estima, não descarta a ação de uma força poderosa que conspira permanentemente contra essas criaturas, a vaidade. Esses seres incautos pavimentam seu destino na estrada da oligofrênia e por isso mesmo não se dão conta que são o objeto do escárnio e da pilhéria pública. Não se pode perder de vista que existem dois mundos, o visível e seu contrário. Esse último, o invisível, é o real, o outro é pura representação. Nós não temos o controle sobre o OUTRO e nesse caso não há lugar para polêmica e não é um sofisma. É a arrogância dilatada ao extremo, que leva certas pessoas à exposição pública desempenhando um papel triste com maestria vida afora.

Quem te garante que seu filho encantador não seja um traficante empedernido? Que seu aluno cordato, com ares de admiração, te considere um mestre? Que sua empregada há 20 anos não te roube um pouco a cada dia? Que as declarações de amor são a expressão de um sentimento verdadeiro? Que os elogios não sejam meras palavras? Que seu namorado só o é a sua frente? Que seu pai seja o machão que se apresenta? Que na virada da esquina aquele que estava sob seus olhos, seja a mesma pessoa? Que enquanto você agoniza, alguém comemore?

A certeza sobre o OUTRO só a tem aqueles que não saem da jurisdição de si próprio e acabam caindo na órbita do riso do OUTRO ou dos OUTROS o que é bem pior. Mas ainda assim saem ganhando, porque a estupidez e a cegueira são irmãs siamesas.

Cuidado com a pegadinha. As manifestações de uma alta auto-estima podem ser uma farsa para escamotear uma auto-estima zerada. Não tem saída, para qualquer lado que se ande a indiosincrasia de cada indivíduo garante sua singularidade. Mais uma vez, nem sempre o que se vê se é.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Dê-me um dia, que seja o dia de Natal

Hoje vou falar dos homens comuns em um dia extraordinário: o dia de Natal. A idéia pode ser um tanto delirante até insignificante para alguns, mas mesmo na recusa sectária dos que nada creem, o dia de Natal não é um dia comum, nem para os homens extraordinários. Por isso, sobre Lou Andreas-Salomé, mulher que fez da vida sua grande paixão, Freud escreveu: “Você tem um olhar como se fosse Natal”. Assim, com essa sensível comparação metafórica Freud agradeceu a Deus, no reconhecimento de sua existência, a via luminosa que o permitiu devassar o mundo do inconsciente. Ao homenagear Lou Salomé, Freud se curvou perante o ópio da fé.

Não vou pensar no universo religioso e sua magia, limitar-me-ei ao significado do dia de Natal e seu ritual terapêutico nas almas dos homens do mundo Ocidental. É patente a profunda influência do dia 25 de dezembro no calendário onírico das pessoas. O tempo que o precede pode ser curto ou longo, coletivo ou solitário, triste ou alegre, mas nunca é um tempo indiferente. Esse é o tempo que dedicamos às incursões na memória. São reminiscências longínquas, perdidas, mas que ocupam um lugar único no espaço nobre do coração. É a saudade, maior punição do homem, de um outro ou de outros Natais evocados para dar um alento à alma e perpetuar por instantes o que pode ter sido apenas um glorioso acaso. É a “Noite Feliz” que nos reporta às nuanças de momentos tão particulares, que o primeiro acorde atualiza o tempo. Sentimentos adormecidos durante 364 dias de súbito tomam o vulto assustador de realidade. São os presentes. Nada no mundo se assemelha à beleza do ato de presentear, de materializar simbolicamente um sentimento, uma deferência do espírito e o privilégio de estar dentro de algum coração no momento da escolha. Como são queridos os presentes. Só um ramo de mirra, é o bastante. São as árvores iluminadas, as luzes que se acendem desesperadamente para se sobreporem a qualquer sombra que por ventura ameace a transparência do Dia. É a festa, as delícias, os néctares, os risos, os abraços, as surpresas, as chegadas inesperadas, a felicidade sem fim.

É tudo ou nada. Para a maioria é nada. Esse é o outro lado da moeda, o que prevalece no mundo dos homens, e aí, sem distinção de pontos cardeais, aqui e alhures é o lado real...nada. Não existe Natal nem no sonho, nem na fantasia. Não se sonha com o desconhecido. As festas, iguarias, néctares, etc... são inimagináveis. Presentes? Há milhares de mãos esfarrapadas estendidas pelo mundo afora que não encontram nada que as façam sentir merecedoras da própria vida, que dirá de um presente. Visitas à memória? Melhor adiar. Buscar o quê na esterilidade do passado? Luzes?
Essa história de “Feliz Natal” é um vício de linguagem. Falácia do mundo das palavras. Quem conhece minimamente a história, só tem lugar para tristezas no coração sempre em choque com a animação do espírito. A efemeridade do agora, intervalo entre as angústias do passado e falta de perspectivas para o que será, não permite vida longa à felicidade. Quem pode ter um dia feliz depois da retirada de milhares de pessoas sob a mira da morte em Kosovo? Isso foi ontem, um simples exemplo perto de outras barbaridades manifestadas pela natureza humana. Como desejar um “Feliz Natal”, ao dia seguinte, que não aparente cínico a alguém que traz na alma golpes mortais instalados na véspera? Eu diria que não há como viver o Natal os homens de consciência delicada, marcados pelo vivido como uma tormenta em alto-mar. Não há mais mãos para segurar esse leme. É na indiferença do homem à sorte do outro, sintetizada na aviltante dupla “problema seu” e “eu não posso fazer nada”, a razão da história do homem estar imersa em um profundo mar de lágrimas.
Mas, que ironia...o universo das representações não sucumbe, não se curva perante os desvarios da humanidade. Hiroshima transformou-se em meu amor. Vão aparecer sapatinhos em algumas janelas, tem Papai Noel confirmando a alegoria do Natal em toda parte, Lennon continuará cantando que a guerra acabou. Feliz Natal...é a ordem do dia.

domingo, 13 de dezembro de 2009

Dor que mata: a injustiça



Há 30 anos dando aulas, há 30 anos estudando a história da América Colonial, do Peronismo e da Guerra Civil Espanhola. Injustiça. A história é a história da injustiça do homem. Trago a alma exaurida dessas leituras depressivas que reiteram a minha concepção negativa da humanidade. Quanta guerra, quanta morte, quanto ódio, quanta injustiça. É a marca humana que comporta paradoxos como guerra e paz, amor e ódio e o pecado e o perdão. Por paixão política e fidelidade à ideologias de direita e também de esquerda os homens cometem ignomínias desprezíveis que inequivocadamente, a pátina do tempo as transforma em história. O holocausto virou história, tema batido, ouvi isso há pouco tempo.

No final do semestre letivo tenho a mente povoada de escravos torturados, de índios desgraçados, de padres mais ligados à matéria que ao espírito (há exceções notáveis), de discursos e práticas políticas que se incompatibilizam, de Inquisição, de fascistas, de assassinatos de guerra, de ditaduras hediondas, de crimes em nome da tradição cristã e isso é só para começar. Aulas, simplesmente aulas, sem emoção, sem ódio, sem paixão. Aulas inodoras, anódinas.

Meu maior prazer: a inversão. Não obstante o escopo e intensidade da injustiça ela não passa desapercebida, não tem um fim em si mesma. O poder aparentemente concentrado nas mãos de alguns é a grande falácia histórica. Os homens vingam e essa vingança que aparece nas inversão do papéis não é má, é imprescindível para se acreditar que não está tudo perdido. É a vingança silenciosa do escravo que quebra todos os brotos da cana recém-plantada, é o índio oferecendo sacrifícios veladamente aos seus deuses, é Tarantino na história/ficção em Bastardos Inglórios, é Dogville, é o ladrão roubado, o perseguidor perseguido, o assassino torturado, enfim o momento do êxtase maior, a virada do jogo. É não esquecer, mas se esquecer, não perdoar e se perdoar, não reconciliar. A injustiça inspirou Castro Alves: "Colombo! Fecha a porta de seus mares!". Ah se fosse possível reverter o tempo e impedir que feras viessem ao mundo em forma de homens.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

E não se sabia de nada: elogio à ignorância





Abençoados sejam os ignorantes,a eles está assegurada a felicidade na terra. Será isso uma verdade? Acho que sim. É a dádiva de não saber, de nada conhecer, de não ser alfabetizado, de viver para sobreviver, de não prever o óbvio, de não saber que não sabe, de não compreender às palavras, de não perceber às ironias, de rir onde deveria chorar, de não ter auto-crítica, de jamais ter ouvido falar em auto-estima, de não se dar conta do desrespeito do outro, de ser mal informado sobre tudo, de passar pelo mundo na cegueira absoluta, de não ter domicílio fixo e ser como dizia Da Vinci "um simples condutor de alimentos".

A ignorância é como a pátria, aliás é a própria pátria. Ela garante a liberdade, a liberdade de viver sem saber de nada. O ignorante teve o prêmio de ser liberado de sua condição intelectual e é nessa fortuna que desenvolveu sua virtude maior, a de não perceber a si próprio. Essa é a sutileza da graça divina, ser salvo da danação pela protetora maior: a Santa Ignorância.


Não foi por nada que em uma carta à Mlle. Leroyer de Chantepie em setembro de 1858 Flaubert escreveu sublimemente: "O único meio de suportar a existência é despojar-se na literatura como numa orgia perpétua."

sábado, 14 de novembro de 2009

Se houvesse escolha, a vida seria outra


Gosto de pensar a vida metaforicamente, talvez porque assim ela me pareça mais suave. Da noite para o dia sem que possamos pensar ou até mesmo reagir, tudo muda. Muitas vezes fui levada por correntezas plenas de deleites. Nunca as aproveitei devidamente, sempre soube que nada é para sempre e assim a expectativa do pior invalidava a dádiva do momento. Escolha, têrmo levianamente usado, não existe. Existem sim as contingências da vida e é no interior delas que nos movimentamos como podemos. Por isso gosto do aforismo sartriano, "não importa o que fazem com a gente, mas o que fazemos com o que fazem com a gente". Pensei em uma poesia que reflete meu estado de espírito permanente. Há quem aposte que no efêmero está a beleza e magia da vida. Pode ser. Essa é uma convicção salvadora.

A Flor e a Fonte Vicente de Carvalho

"Deixa-me, fonte!" Dizia
A flor, tonta de terror.
E a fonte, sonora e fria,
Cantava, levando a flor.

"Deixa-me, deixa-me, fonte!"
Dizia a flor a chorar:
"Eu fui nascida no monte..."
"Não me leves para o mar."

E a fonte, rápida e fria,
Com um sussurro zombador,
Por sobre a areia corria,
Corria levando a flor.

"Ai, balanços do meu galho,
"Balanços do berço meu;
"Ai, claras gotas de orvalho
"Caídas do azul do céu..."

Chorava a flor, e gemia,
Branca, branca de terror,
E a fonte, sonora e fria,
Rolava, levando a flor.

"Adeus, sombra das ramadas,
"Cantigas do rouxinol;
"Ai, festa das madrugadas,
"Doçuras do pôr-do-sol;

"Carícia das brisas leves
"Que abrem rasgões de luar...
"Fonte, fonte, não me leves,
"Não me leves para o mar!..."

As correntezas da vida
E os restos do meu amor
Resvalam numa descida
Como a da fonte e da flor...

domingo, 8 de novembro de 2009

DESVIVER E VIVER, UM ÚNICO DIA




Que benção seria desviver hoje. Meu último pedido seria nunca ter vivido e o direito de viver por um único dia, um dia dos meus oito anos, a inocência.


MEUS OITO ANOS
Casimiro de abreu

Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!

Como são belos os dias
Do despontar da existência!
- Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar - é lago sereno,
O céu - um manto azulado,
O mundo - um sonho dourado,
A vida - um hino d'amor!

Que aurora, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar!
O céu bordado d'estrelas,
A terra de aromas cheia
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar!

Oh! dias da minha infância!
Oh! meu céu de primavera!
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã!
Em vez das mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minhã irmã!

Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
Da camisa aberta o peito,
- Pés descalços, braços nus -
Correndo pelas campinas
A roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis!

Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo.
Adormecia sorrindo
E despertava a cantar!

Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
- Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
A sombra das bananeiras
Debaixo dos laranjais!

domingo, 1 de novembro de 2009

O Dia dos Mortos


Nada mais emblemático que a Pietá para representar a dor da perda de um filho, está é uma dor que mata. Amanhã é o dia dos mortos, dia triste, fúnebre, nostálgico, dia da dor que entra no coração dá uma pequena volta e entra outra vez. Que vontade desesperada de ver seu rosto, de ouvir sua voz, aquela voz que no mundo não há igual, seu alô ao telefone, quero te ver andar com seu passo em harmônico compasso, seu riso, quero seu cumprimento no dia do meu aniversário, sempre o primeiro. Quero você de novo, quero escutar o que tem a dizer, quero ouvir sua sensatez, quero te ver cultivar as orquídeas, quero ouvir seu assobio, quero te ver fumando, tomando chimarrão,ouvindo a transmissão do jogo do Atlético (hoje êle ganhou,3 gols para você), quero você com a minha idade, somos iguais, eu te alcancei e hoje sou mais velha que você. Aquele foi o dia mais triste da minha existência, febre interna, alma agitada, dor intensa sem interrupção, sem remédio, é a única que consigo sentir outra vez. É só lembrar de você e essa dor volta como um vulcão em erupção.
Mas eu te chamo, venha só um por um tempo, diga que você só foi ali, converse pelo amor de Deus, entre por essa porta então, não fale nada, mas deixe que eu ponha meus olhos em você materializado uma vez mais. Eu não suporto a idéia de conviver só com as lembranças, te quero real. Quero ser menina e ter ainda você, meu pai.

Senhor, dê-me um dia, só um dia para acalmar essa dor além de qualquer expressão. Se não pode ser de outra forma, se é o único caso que o "nunca mais" se aplica inexoravelmente, traga o meu pai no meu delírio onírico.

Amanhã é o dia do mortos. A morte não existe, ela ronda e leva as pessoas que continuam vivas e falando dentro da gente até acontecer o grande encontro. Disso não tenho dúvida. Nesse dia não haverá mais nem uma lágrima, só o sentimento de plenitude de ver meu pai e tornarmos eternamente iguais.

Meu pai, Paulo Campolina, meu pai.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Vai entender...I


O mundo está virado de ponta à cabeça, ninguém fala mais a mesma língua, há de ser poliglota para entender até seu amigo de uma vida toda.
Cada dia está ficando mais complicado entender as pessoas através das palavras. Eu não sei bem qual é o problema, mas os diálogos tornam se cada vez mais incompreensíveis. As palavras têm sido usadas para fins que não lhes foram atribuídos. Cada palavra tem uma significado e pode ter vários mas o emprego delas tem que ser minimamente respeitado. O tal de “com isso eu quero dizer”, pode ser dispensado, a palavra para o mundo dos mortais tem que significar uma coisa só naquele contexto e não se discute. Quanto à sofisticação da retórica, seu uso deve se restringir a situações que têm a ver com o interlocutor. Mas no cotidiano batata é batata e não "má nota" senão a incompreensão é batata. Os diversos significados de algumas palavras é indiscutível , todavia há por parte de um certo tipo de pessoas, que tem se multiplicado, a crença de ter o status de erudito garantido falando “difícil”, ou usando têrmos que poucos entendem, e às vezes nem os próprios falastrões. Isso, no entanto, não importa, o quê realmente importa é que quanto mais simples fôrem as palavras e claras fôrem as frases, mais rápido a gente fica livre de conversar com os outros e das incansáveis explicações do significado que cada um escolhe para “suas” palavras. Não poucas vêzes as frases são tão truncadas que a resposta ao pedido de uma melhor explicação é uma outra ignomínia do tipo “você entendeu, né?” Não, não entendí e se entendí foi do meu jeito, amanhã passo a estória prá frente, o que é um hábito do qual muito me orgulho, e o outro afirma que estou inventando. Venho sofrendo muitas injustiças pelo uso indevido da palavra, dos outros.
Até para se orientar sobre os estabelecimentos que comercializam um determinado tipo de mercadoria, não podemos mais confiar nos nomes das lojas, que em geral, não têm nada a ver com o produto em questão. Por exemplo, Chicletes com Banana não é sacolão, é loja de roupas. Topa tudo, não é rendez-vous, é loja de móveis usados. Doce Docê, não é da gente, tem dono, e se você pegar alguma coisa sem pagar, cana, que também não é de açucar. Sabor de Mel não é um apiário e sim uma invenção moderna, comida a quilo, todo mundo sabe quantos quilos você come por refeição, uma exposição pública da esganação humana. Na Galinha Ruiva nunca encontrará ovos, só pães. Red Lips não é loja de cosméticos, mas de sapatos. Comprar disco barato em Belo Horizonte é na Sem Nome, roupa de gordo na Varca, Fofão é uma casa de lanches, comer lá significa que em pouco tempo será conhecido pelo nome do estabelecimento. Não procure uma partitura musical na Alegretto, lá encontrará bijuterias. Não podemos esquecer dos grandes monarcas, Rei do Pé de Porco, Rei dos Calçados, Rei do Tic-Tac (relojoaria) e vai por aí. Espero que não apareça em breve O Rei Vesgo para eu poder marcar uma hora com o oftalmologista.
As situações se complicam porquê se um cara de shorts e tênis te pergunta onde é o Mineirão (supermercado de Belô), você tem que perguntar o que êle realmente procura, caso contrário, a informação será errada. O cara queria comprar arroz e feijão e você o manda para o estádio de futebol, sacanagem.
Outra coisa interessante é observar o nome das marcas de certos produtos em supermercados. Uma vez perguntei a uma amiga na padaria se ela ía de Seven Boys e ela me respondeu, vou, mas um de cada vez. O marido perguntou à mulher se ela queria um “Bis” e a assanhada já queria saber se era ali mesmo. Até hoje nínguem descobriu porque um certo sabão em pó foi chamado de Omo quando essa palavra significa prematuro, isso sem contar o da marca Minerva que de deusa da sabedoria virou branqueador de roupa encardida. Os absurdos continuam e se proliferam. Adoro as marcas dos secos e dos não secos, tem a farinha de trigo Boa sorte, o fubá Mimoso, o polvilho gay, Marinez, o santo arroz São Jõao, a ervilha Jurema e o leite condensado que é Moça há um século, isso é uma sorte verdadeira. Nada disto teria importância se ao longo do tempo os produtos não passassem a ser identificados com as marcas, e é por isso que os desavisados ficam atônitos quando escutam duas donas de casa conversando. Pois é, ontem bati um bolo com Boa Sorte depois de lavar a cozinha com Minerva porque o Omo está muito caro, comi 3 Bis, 2 Seven Boys e temperei a salada para o jantar com o Gallo porque a Andorinha voou. Pelo amor de Deus, já pensaram que luta tirar azeite de um galo ou de uma andorinha? E ordenhar uma moça para ela dar leite doce e cremoso por toda a vida? Isso só pode ser malvadeza.
E as oficinas? Há uma proliferação delas. Temos a Oficina do Pão, a Oficina de Música, a Oficina dos Calçados, a Oficina das Meias, a Oficina dos Móveis, a Oficina das Trufas, a Oficina da Pizza, a Oficina do Cabelo, a Oficina do Pezão, até anjo virou artigo de oficina, visite a Oficina dos Anjos, é muito linda, só tem anjo trabalhando, de asa e tudo. Brevemente vão inaugurar a uma casa funerária com o sugestivo nome de Oficina dos Defuntos e uma outra mais original ainda, Defunto e CIA ou Rígido e Calado, é patético, mas verdadeiro, Parafuso e Cia, será o prego?

E lá vou eu….Alguém há de ser normal. Amanhã escrevo mais, se tempo tiver.

sábado, 24 de outubro de 2009

Da Conquista I


Há muito venho querendo ensinar algumas coisas aos homens, vou fazê-lo muito embora esteja certa que êles nunca vão me ouvir, no entanto afirmo antecipadamente que aquele que me der crédito será o queridinho das mulheres.
Só para dar uma informação importante e que os homens prestem bem atenção, isso aqui não sou eu que penso e sim a grande maior parte das mulheres. Logo, se você leitor masculino não se der bem na aplicação desses ensinamentos foi porque se deparou com a menor parte. Azar o seu.

DA SEDUÇÃO.
Esse é o momento.Lembre-se do dito popular, "ninguém tem a segunda chance de dar uma boa a primeira impressão". Uma única resvalada para a idiotice, perdeu a mulher e ganhou a maior difamadora de seus anti-encantos. Sedução é uma arte e como toda arte poucos a têm, logo, seja crítico de si próprio para não exorbitar e ser prescrito em horas de conhecimento. Vamos começar pelos olhares, os mais discretos e furtivos causam um maior descontrole hormonal, encarar, apertar os olhos (gênero míope), piscadelas, olhos carentes, olhos lascivos, olhos artísticos, olhos varredura, jamais, as moças desprezam. Na apresentação mostre-se tímido, mãos firmes no cumprimento, nada de apertões à moda de quebrar nozes, simpatia em excesso é para amigos, gargalhadas só se quiser ser morto a pauladas, as conexões “te conheço de algum lugar” ou "nunca te vi e sempre te amei", podem gerar um mal-estar horrível. Não há nada mais artificial e fora de lugar que declarações a pessoas que mal conhece. Esse é o tipo do sedutor popular, muito comum. O inteligente é o "nunca te vi", sem ser acompanhado pelo “que falta de sorte meu Deus”, essa crise de encantamento deve ser evitada para que no futuro não seja essa frase colocada ao lado dos ditos malditos. Ah, nomes, sobrenomes, lugares que frequenta, profissão, não interessam, você só a vê, o entorno é secundário. Esse conselho parte do pressuposto que o cadastro já tenha sido feito e aprovado. Ela ficará encantada ao saber que “nada interessa, só esse fogo que nos liga”, e isso não é para ser falado, frases românticas têm hora, se fôr fora de hora mesmo que sinceras lhe valerá a alcunha de homem de pouca marca. Caso o tema da conversa seja sobre relações pretéritas, seja inteligente, o que passou passou, análises da vida, falar mal da “ex”, preleções sobre o “free again”, execrar o dinheiro pago à pensão, nunca, isso pode ser sua sentença de morte, tenha sempre em mente que as mulheres são ardilosas, fantasiosas e comentadoras. Além disso você nunca conquista só uma mulher, atrás dela estão as amigas boazinhas, as maldosas, as invejosas, as burrinhas, as inteligentes e as feministas, logo, seus sentimentos espúrios devem ser resguardados dos vaticínios agoureiros dessa “fauna invencível”. Quanto ao pedido do número do telefone, faça-o discretamente e ligue, ao dia seguinte. Se não tiver a intenção de ligar não peça, pense que dois dias de ansiedade na alma feminina podem te valer uma vida de retaliação. Por isso a ordem é: tenha postura de homem ou então bye, bye. Pedir telefone ou endereço por vício é coisa incompatível com a modernidade.

DA FORMA DE VESTIR

Vestir bem é privilégio de poucos, demanda bom gosto e algum dinheiro. Mas a aparência mesmo que com uma roupa simples e fora de moda, é fundamental. Estar com a roupa impecável, cabelos limpos e penteados, unhas limpas, desodorante em dia, dentes escovados, são detalhes tão óbvios que não deviam ser mencionados. Mas essa não é a tônica masculina, quanto descuido meu Deus! Mulher agrada de homens bem arrumadinhos. A farda é uma unanimidade, compre uma. Mulher ama, fica louca, perde o juízo por um homem fardado, a patente, essa não importa, nem necessária é, o negócio é a farda, as botas, o quepe (se o tiram e o atiram sobre uma mesa as mulheres caem umas por cima das outras, a arma na cintura,cara impenetrável, é coisa de qualquer mulher perder os sentidos. Quando eu era criança, tínhamos uma empregada doméstica que adorava levar a mim e minha irmã para passear perto do quartel só para ver os piriquitos, era como carinhosamente se referia aos soldados. Um dia ela contou que sonhou que um monte de periquitos tinha dado bicadas nela a noite inteira, eu, penalizada, demorei 20 anos para entender a cara de alegria que ela manteve todo o dia depois de tanto sofrimento. A farda é poderosa, seja do exército, marinha, aeronáutica, e se você não puder comparecer, mande a farda, ela em sózinha dá conta do recado. Isso é também uma substituição, uma alternativa simbólica porque os homens têm tido muitos problemas na área das armas, passar uma mulher nas armas com competência atualmente só as Forças Armadas, caso contrário, é o desarmamento total. Ao lado dessas observações há de se considerar que o soldado representa uma coisa ligada à defesa da Pátria e as mulheres amam a Pátria, esse sentimento patriota é transferido para os soldados que em última análise morrem por ela e nós morremos por êles. Só para tirar a prova da verdade do que digo, comprem uma farda da Marinha, por exemplo, e deêm um bordejo por aí, se fôr em Minas, o sucesso é redobrado, farda e mar, realização imbatível do desejo. A idéia de ter um batalhão de soldados, todos saradinhos, cabelos cortadinhos, impecavelmente vestidos, botas lustrosas, batendo continência a torto e a direito, marchando com o passo sincronizado e de repente levantar aquelas escopetas pesadas com um braço e de uma vez só, é a própria invenção do capeta. É duro, mas desconheço um mulher que despreze um soldado que dirá um batalhão inteiro, quanta alegria. Conselho: em caso de avaria nas armas ponha no video um filme de guerra e estará livre da convocação para essa outra guerra inglória.

DOS DIÁLOGOS

Essa coisa de diálogo aberto, invenção do anos 70, foi determinante para o caos social, ninguém mais quer saber de conversinha bizantina,aquelas que vocês já conhecem e bem. Não há mais segredos, todo mundo conta tudo, mulher não suporta guardar segredos. Nada de diálogos e tertúlias intermináveis. Há o papo-cabeça, esse é o mais forte candidato a ser abatido a tiros. Conversa boa é conversa cheia de risos e casos palpitantes, o resto é balela. Em geral mentirinhas..."sou assim"...e daí sai uma enxurrada de impropérios. Em dois meses de convivência a mulher já sacou, se esperta for, que você não "é assim". Cantar a própria glória. "Nunca fui atrás de mulheres, elas vieram a mim". Esse é o narcisista incorrigível ou o incompetente que não tem cacife para dar uma cantada irresistível. Melhor confessar de cara: "sou um babaca pela própria natureza". A mulher não acredita e você está salvo.

DO DINHEIRO

Esse é o pior, mulher gosta e muito. Homem sem dinheiro é sem valor.
Mas não fiquem tristes, mulher de verdade gosta é de beijo, beijo na boca, olho fechado, mãos que acariciam os cabelos, (pode arriscar até uma lágrima furtiva, é parte do show até há pouco tempo prerrogativa feminina), palavras doces...sem exagero. Quanto ao dinheiro, pelo menos as suas próprias contas, pague você. A curto prazo mulher moderna dispensa homem oportunista, a médio prazo toma antipatia mortal e a longo prazo prefere a morte em um garrote vil a pagar contas para homens. Nesse ponto o homem tem que convir que apesar da liberação feminina, o mundo de hoje pressupõe a igualdade e não a inversão dos papéis. Há homens que trazem por uma vida um escorpião no bolso. Ademais é feio, uma vez ou outra vá lá, mas sempre,convenhamos, torna uma marca indelével desse tipo explorador. No entanto, toda regra tem exceção, muitas vezes paga quem tem mais, e se for a mulher...que pague ela, sem chôro nem vela. Só para relembrar o passado, muitos homens foram à miséria por se submeterem aos caprichos femininos. Isso aí é um anacronismo, logo não dê dinheiro às mulheres, mas por princípio de ordem moral, também não tome. A vida é dura!!!!!Cada um por si Deus por todos. Assim fica todo mundo feliz.

E lá vou eu, depois vem mais.

O CIRCO III




Ao dia seguinte a cidade mal dormida se preparava para a avant-première do Gran Circo Trota Mondo. Rita que nunca saía dos limites da fazenda, com a anuência de Dona Eralda, ultrapassou-os uma hora antes do início do espetáculo e entrou com toda sua estranheza para dentro da lona colorida, ela também queria ver o circo. Assistiu impassível o show até quando se deu a hora esperada por todos, a apresentação dos trapezistas. A música empolgava a platéia, ao lado dela os tambores marcavam a cadência do perigo iminente. Rita olhava entorpecida para os trapezistas. Talvez os invejasse em seus mirabolantes vôos ou então na intimidade que demonstravam com o trapézio. Acabado o show foi anunciado que a cada dia da temporada os artistas apresentariam uma novidade, e no último dia do circo em Colina Velha os trapezistas, com os olhos vendados, apresentariam o mundialmente famoso triplo salto mortal.
Rita foi a todas as apresentações acompanhada por Dona Eralda que se sentia muito feliz em saber que Rita gostava de algo mais que o arco-íris e suas árvores de jasmim enfileiradas em ordem crescente. Dona Eralda observou que as mãos de Rita ficavam úmidas e cerradas enquanto as piruetas no ar não cessassem. Realmente o circo exercia um fascínio mágico em Rita, a estranha Rita.
No derradeiro dia da estadia do Gran Circo em Colina Velha, Rita amanheceu com os olhos inchados, Dona Eralda desconfiou que a moça teria chorado durante a noite, mas nada comentou. Uma hora antes da apresentação encaminharam-se para o circo, afinal seria o dia do grande show. Sentaram-se na primeira fileira e dali assistiram os palhaços e suas palhaçadas que Rita não achava graça, viram o contorcionista, viram o desfile de cavalos com os equilibristas dando cambalhotas sobre os animais com precisão matemática, viram os domadores que com apenas um chicote controlavam as feras que pareciam cansadas daquele cativeiro perpétuo. Depois de quase duas horas de apresentação chegou o esperado Gran Finale, em fila os trapezistas entraram no picadeiro correndo e fazendo mesuras ao público que regozijava de felicidade.
Começou o show com as acrobacias no trapézio, piruetas no ar, troca de duplas, um verdadeiro ballet voador onde o tempo e o equilíbrio significavam para o artista a própria vida. Era o mundo circense encantando e provocando a mais forte adrenalina nos pacatos moradores de Colina Velha. Depois das apresentações mais simples os tambores começaram a soar de forma rigorosa impregnando o ar com o suspense que anuncia a morte. Os trapezistas subiram até o trapézio e fizeram algumas apresentações até que o silêncio invadiu todos os espaços da cansada lona, que tremia ao som dos tambores, vigorosos e ameaçadores tambores.
O primeiro salto mortal, foi exibido por um rapaz muito baixinho e magro, o sucesso foi tão grande que as arquibancadas balançaram-se com o entusiasmo da platéia. O segundo salto foi a estréia de um rapaz jovem, muito bonito, vestido de branco e dourado, para ele aquela era uma noite de gala, seu salto seria o triplo, o mundialmente famoso salto mortal triplo. O jovem teve seus olhos vendados, sentou-se no trapézio e começou um leve balanço enquanto o companheiro que lhe faria dupla esfregava nervosamente as mãos. A rede foi tirada e o silêncio sepulcral tomou o lugar como se tivesse vindo para ficar. Nessa hora Rita à semelhança do branco do mármore preservou seus olhos de qualquer imprevisto. Poucos segundos depois os aplausos, assobios e gritos invadiram o circo. O salto foi perfeito, impecável. Para os olhos cerrados de Rita o som informava que a vida vencera à morte. O jovem emocionado abraçava os colegas de tão perigosa façanha e com os braços levantados agradecia à fiel platéia. Nesse momento todos os artistas do circo entraram no picadeiro, fizeram um agradecimento coletivo a todos os habitantes da cidade. Sob a vibração incessante do público as luzes foram apagadas uma a uma até que a meia luz o circo ficou inteiramente vazio.
Na manhã seguinte quando Dona Eralda chegou na cozinha viu que Rita ainda não se levantara, foi ao seu quarto e ela ali não se encontrava. A mulher que já tinha uma verdadeira afeição pela moça, sentiu uma profunda dor no peito, mas entendeu que ela desapareceria como apareceu, sem uma palavra.
Na rua principal da cidade os caminhões do circo já se encontravam perfilados para a partida. Os habitantes também estavam perfilados para a despedida. Depois dos motores ligados começou o lento movimento dos carros deixando para trás uma cidade tristonha com saudade antecipada.
Andaram quase quatro quilômetros quando o motorista da caminhonete deu uma súbita freada à entrada de uma ponte muito extensa. Bem em cima da murada que ladeava a ponte estava uma moça se exibindo, à moda dos malabarismos apresentados pelo circo. Seu Fernandez, dono do circo, sentado ao lado do motorista sentiu um tremor percorrer lhe as veias, era como seu sangue mudasse a direção do fluxo. Ele conhecia aquele corpo esguio, aqueles cabelos negros que ao vento voavam como flechas, aquela leveza no salto e equilíbrio na parada. Não, no mundo não havia igual. Desceu enlouquecido da caminhonete gritando: Lina, minha filha, meu amor, até que enfim eu te encontrei. Jogando-se tragicamente no chão, deixava que grossas lágrimas escorressem-lhe pelo rosto amargo e enrugado, lamentava pelo tempo de sua ausência que tamanho sofrimento tinha infringido a ele. Rita, indiferente à cena, prosseguia em evoluções perfeitas.
Contrariamente a exuberância de sua apresentação, seu espírito, em dolorosa incursão à memória ouvia como se fosse naquele exato momento, os gritos furiosos de seu pai há quinze anos atrás, quando ela deu à luz a um filho e foi covardemente expulsa do circo, depois de ter a criança violentamente arrancada de seus braços. Ainda sentia no rosto o peso da mão de D. Fernandez , para livrar-se dela que o agarrava desesperadamente suplicando por clemência e piedade. Ressentia da impostura de sua mãe que nem por um segundo interferira por ela para aplacar a fúria do pai. A sua mente vinha o olhar cínico de Jorge, o domador de animais, que brutalmente a domou e acovardou-se para confessar a verdade perante a ira do patrão. Seu filho não tinha pai. Jogada para fora do trailler Rita, com apenas quinze anos, foi abandonada à própria sorte.
Desesperado, arrependido e culpado, Dom Fernandez explicava à Lina que tudo aquilo tinha sido apenas uma reação de momento, implorava por seu perdão, pranteava pelos quinze anos sem a filha adorada, jurava que por todo esse tempo, encontrá-la era sua obsessão. Enquanto os artistas se acercavam de D. Fernandez , o trapezista que dera o salto mortal triplo na noite anterior, desceu do trailler para ver o que estava acontecendo do lado de fora. Quando o viu, o avô gritou, venha Yuri, essa é sua mãe, ela voltou Yuri, ela não vai nos abandonar nunca mais. O jovem a olhou com o ar de desprezo do filho abandonado pela própria mãe. Rita parou como se estivesse em estado de concentração. A palavra abandonar ecoava em seus ouvidos e tinham o efeito de lâminas dilacerando seu corpo. Seu pai, sem consciência do ódio irreversível e sem limites da filha, foi se encaminhando cambaleante para sua direção com os braços abertos e uma certa expressão de alívio na face até então transtornada. Rita balançou negativamente a cabeça, lançou um olhar mortal para o pai, andou três passos para trás e seus pés decididos impulsionaram seu corpo para alto no mais perfeito salto triplo mortal. Não tinha os olhos vendados, a rede foi a correnteza do rio que a acariciou e acolheu como o fez Dona Eralda, seu anjo da guarda.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

O CIRCO II


Um belo dia daqueles que não ameaçam a ninguém, o céu estava colorido de azul sem que uma única nuvem maculasse sua pureza, enquanto o tempo esperava passar-se, ouviu-se de longe uma música que aumentava à medida que se aproximava da cidade. De repente surge uma caminhonete iluminada que cantava a plenos pulmões músicas de gente feliz. Atrás dela seguia uma grande fila de caminhões coloridos. Toda aquela alegria só se assemelhava ao cortejo de um circo, e o era. Nada acontecia em Colina Velha, a surpreendente chegada de um teatro ambulante era um evento de tão soberba importância, que os mais cultos e viajados tinham que contar à pobre população o que era aquilo, essa não sabia o que era um circo, ou nunca tinha visto um. A honra da visita trouxe tanta emoção para os colinenses que a natureza se viu obrigada a solidarizar-se com eles e tomar sua diligências. O vento acordou de seu sono de quase três semanas e varreu desvairadamente as ruas. A poeira era tanta que o céu encarregou-se de lavar o ar, executou a tarefa tão rapidamente que em menos de dois minutos já não haviam sinais que denunciassem o grande temporal, Colina Velha estava vestida de gala para a festa, seria aquilo um milagre? Depois de ceder aos caprichos do céu, o sol voltou a brilhar com seu singular esplendor, mas sua vocação democrática abriu alas para que um enorme arco-íris, imitando a aurora boreal, desse o toque final no divino show. Velhos, jovens, crianças corriam à rua principal da cidade para receber o nunca visto. A cidade estava em estado de torpor. O circo era a ilustre visita que Colina Velha recebeu de braços abertos e sorriso escancarado.
Frei Martinho conhecido e respeitado por seu fervor religioso revelou-se quando viu o grupo de palhaços no grande desfile. Mandou que os moleques da cidade, em rara concessão, repicassem os sinos da igreja. Gritava desesperadamente para os fiéis que as atividades religiosas estavam suspensas enquanto o circo estivesse na cidade, justificando que o sagrado e o profano não poderiam atuar juntos.
Eufórico, confessou a uma beata que não lhe dava trégua, que sempre sonhou em ser palhaço, mas como não tinha graça nenhuma entrou para a Ordem de São Francisco de Assis. A mulher que nutria pelo padre uma católica adoração, ficou tragicamente arrependida por ter confessado aquele palhaço frustrado seus pecados veniais e mortais. Mas o melhor ele guardou para si, era o segredo que mantinha sob a batina. Todas as noites depois da missa quando estava a sós na Igreja de São Francisco, onde era pároco há nove anos, Frei Martinho, se livrava da farda, colocava uma calça listradinha e uma camiseta justa e cuidava do altar fazendo gracinhas, revirando-se em cambalhotas e pondo língua para a imaginária platéia. Um dia, não há muito tempo, quando estava no auge de sua apresentação, bem defronte ao Santíssimo, seu Áureo, o sacristão, flagrou Frei Martinho ensaiando um contorcionismo incomum em um clérigo. Horrorizado seu Áureo deu um gritinho frouxo enquanto o esperto e lépido Frei, aproveitando-se do faniquito do escudeiro, simulou um desmaio que lhe valeu duas semanas de cama e uma batelada de exames. Doutor Peninha, consagrado na cidade como o curador, comunicou a todos que o Frei tivera um aneurisma inoperável e pelo tal não poderia exercer suas funções de pároco. A cidade orava dia e noite pelo Frei que só queria se ver livre de todos para dar seu costumeiro show para os santos que adornavam sua igreja, fiel e imóvel platéia.
O reconhecimento da graça do Frei palhaço veio no dia que Jesus lá de cima da cruz pediu bis. Foi a glória para Martinho, bisou cinco vezes e pacificou o espírito de palhaço frustrado substituindo-o pelo de palhaço do Senhor. Uma honra evangélica que o Frei jamais esqueceu, esse era seu alento diário, "Jesus é meu tiete". Agora, com a chegada do circo a festa seria real.
Enquanto tudo acontecia, Rita estava muito longe da algazarra. Tinha saído a cavalo para buscar uma novilha desgarrada, aliás montava como uma amazona, e não escutou a música do circo. Mas ao ver o arco-íris começou a se ocupar de seu ritual, dessa vez dançando sobre o dorso do cavalo, quase alado. Dona Eralda que sempre respeitou os desvarios ocasionais da moça, foi procurá-la onde a mesma reverenciava o arco-íris. Ficou chocada quando viu Rita dando saltos artísticos com equilíbrio absoluto em cima do animal trotando, que com ela formava uma dupla perfeita. Dona Eralda chamou-a, venha Rita, venha ver a novidade. Sentido-se ultrajada por ter sido interrompida no seu único momento de êxtase, Rita não respondeu a patroa, pela primeira vez.
Desconcertada pelo desrespeito Dona Eralda ameaçou-a, você será a única da cidade a não ver a chegada do circo. Ao ouvir a palavra circo Rita enrijeceu-se, era como se algo absolutamente inexplicável tivesse operado dentro de seu corpo endossado por um tremor da alma. Rita saltou do cavalo como fazem os equilibristas e já no chão perfeitamente de pé olhou para Dona Eralda com um daqueles olhares que ficam impressos para sempre no alvo. Assim ficou por uns minutos até que a patroa compadecida a envolveu com seus braços fortes e amparou a pobre moça. As pernas de Rita foram dobrando de mansinho até perderem toda a força jogando-a ao chão. Deitada e abraçada em si mesma Rita chorou. Dona Eralda, chocada com o inesperado espetáculo que acabara de assistir, de alguém que julgara de pedra, ajoelhou-se e perguntou, o que aconteceu minha filha? Entre dois riachos que corriam pelas curvas de seus lábios trêmulos, Rita olhou para aquela que um dia a acolheu e com austera voz de fiapo articulou um não sei não. Dona Eralda lembrar-se-ia para sempre daquele olhar irremediavelmente estilhaçado. Ela sabia que o subterrâneo da alma de Rita era impenetrável. Perante aquele coração sombrio, repleto de temores, Dona Eralda sentou-se escrupulosamente ao lado da leal empregada, abraçou-a fortemente e essa sem nem um cisco de resistência aninhou-se no colo da patroa. Ali ficaram imóveis até o sol esfriar e ir esquentar as antípodas.

domingo, 18 de outubro de 2009

O CIRCO I


Quando Rita chegou à Colina Velha todos os habitantes da pequena cidade prestaram atenção nela. A moça não tinha nada que a qualificasse ou a desqualificasse, ela era simplesmente estranha. Ninguém sabia de onde vinha, ou a que vinha. Ela chegou à noite e durante toda a madrugada ficou sentada no único banco da rodoviária, o vigia noturno não arredou dela seus olhos, ela não chegou a percebê-lo. Quando o dia começou a ensaiar seu nascimento Rita levantou-se e caminhou a passos curtos e lentos para a direita, caminhava sem destino. Por todos os lugares que passava as pessoas a olhavam e se entreolhavam buscando uma apresentação ou uma pequena saudação, essa ou a outra não vieram. Depois de uma longa caminhada chegou ao acaso em uma fazenda muito bem cuidada que ficava a quase 8 Km. da rodoviária. Ao lado da porteira estava sentada em um pequeno banco de madeira uma mulher já adentrada nos quarenta, de rosto suave porém forte. Sem que Rita lhe endereçasse os olhos Dona Eralda interpelou-a, está em busca de serviço moça? Com um leve movimento de cabeça Rita assentiu e passou indiferentemente pela porteira.
Desde esse dia passaram-se 15 anos. Rita que à época tinha 16 anos, trabalhou de sol a sol para Dona Eralda que sem jamais tê-la visto acolheu-a em sua casa.
Era uma família pequena onde a matriarca Eralda comportava-se como se tivesse sido ungida por Deus para imperar naquele lar sem concorrentes até a morte. Tinha três filhos homens, adultos e de boa aparência. Os três eram inteiramente submissos a ela. Na cidade de apenas 3000 habitantes, eram conhecidos por “as meninas de Eralda”. Essa pilhéria que corria também pelos arredores da pequena cidade, não arranhava em nada a boa relação da mãe dominadora com os filhos dominados. Muito pelo contrário, para eles era confortável que ela, sabidamente excelente administradora, cuidasse da fazenda extraindo-lhes a pena de pensar e trabalhar. A ela eles deviam tudo que tinham na vida além da própria vida, o único preço era a obediência, a qual pagavam com muito gosto.
Os primeiros meses de Rita na fazenda de Dona Eralda provocaram uma grande curiosidade nos habitantes da cidade. Rita não falava de si nem dos outros, respondia evasivamente às perguntas que os bisbilhoteiros lhe faziam, nunca namorou ou olhou particularmente para qualquer rapaz da cidade, ninguém jamais a procurou, seu sobrenome e origem jamais foram revelados. A vida de Rita era um mistério. Mas como a pátina do tempo a tudo alheia, Rita saiu privilegiada. Pouco demorou para que ninguém mais se importasse com ela, assim como ela nunca se importara com ninguém.
Rita era uma moça de estatura média, pele branquinha, cabelos pretos e longos, os olhos eram castanhos com um formato ligeiramente amendoado que só emprestavam vida ao seu rosto nas raras vezes que Rita sorriu nos quinze anos que ali viveu. O silêncio, a discrição, e a alienação a tudo que lhe rodeava só desapareciam quando após a chuva o sol o arco-íris fazer seu admirável desenho no céu. Nesses dias Rita dançava, cantava, corria em círculos pelo mato, pulava de pedra em pedra, subia e descia das árvores, balançava nos galhos mais altos das mangueiras e de lá saltava com a leveza e naturalidade de um pássaro.
A outra alteração no comportamento de Rita se dava uma vez ao ano, no dia 15 de abril, ela chegara à fazenda no dia 17 do mesmo mês. Nesse dia Rita levantava-se mais cedo que o costume, e se dirigia de cabeça baixa a um jardim só de árvores de jasmim, que ela plantara perto do paiol, na parte mais alta da fazenda. Certa noite enluarada o jardim de Rita exalou um perfume tão forte que ela o considerou como portador de presságios. Essa impressão lhe bateu tão forte que ela dedicou aos movimentos celestes uma noite inteira de contemplação, talvez estivesse à espera de algum sinal do Alto. Essas eram as únicas duas demonstrações da existência de Rita, afora seus afazeres domésticos cumpridos impecavelmente, sem queixa ou esquecimento. Rita era uma moça estranha e essa imagem ela impôs em Colina velha.
Os filhos de Dona Eralda amavam a dedicada empregada sem que ela jamais tivesse lhes dirigido uma única palavra. Quando levantavam pela manhã, o café já estava à mesa com os agrados favoritos de cada um, quando saiam as roupas estavam limpas e passadas, quando iam dormir a cama estava preparada e o pijama dobrado sob o travesseiro afofado como para melhor afagar seus sonhos. O mesmo zelo Rita dedicava à Dona Eralda, esta sempre atenta à estabilidade do comportamento de sua mais fiel ajudante. A única vez que a patroa adoeceu, Rita entristeceu como se estivesse experimentando uma possível orfandade. Demonstrou seu sentimento passando todas as noites sentada no chão ao lado da doente até o restabelecimento da mesma. Dona Eralda jura que durante a noite ouvia um suave murmúrio emitido através do silêncio de Rita. Afirmava a enferma, que podia identificar solfejos de diferentes canções de ninar e talvez um umedecimento nos olhos de Rita. Podia também ser apenas uma impressão.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Ser transparente: é possível


Em uma outra postagem falei da boa prática de nunca se mostrar por inteiro. Fui mal interpretada. Não se mostrar por inteiro significa apenas nunca desguardar os flancos, assim jamais será surpreendido pelos intrusivos que te interpretarão calcados na sordidez da própria vida. Aliemo-nos à sensatez, uma certa discrição e um certo silêncio, sobretudo sobre estórias da própria vida que não dizem respeito a ninguém, só conspirarão a nosso favor. Há pessoas, principalmente aquelas que têm a cidade psíquica comprometida com a pequenez, que se sentem livres para fazer revelações da vida pretérita que até a pátina do tempo já se desfez. Esses momentos epifânicos podem ser devastadores, cuidado! Quando vejo alguém entrar nessa aventura temerária, meus pensamentos empalidecem perante tão ordinário mortal.

No entanto, a transparência é virtude dos grandes. A água, exemplo sublime da transparência, também pode se tornar turva se a usamos mal, se a remexermos muito ela mostrará seu lado negro. Afinal o que é ser transparente? Ser transparente é ser maiúsculo, é ser verdadeiro, é ser leal, é a inclandestinidade de atitudes, é ser forte, é não ter medo do nada, é estar em harmonia com o Bem e sintonizado com a coragem do verdadeiro herói.

A esses reverencio, para esses os deuses trabalham e bem.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

A Fragilidade do Bem





Sabem, os que me conhecem, a forma que lido com as pessoas. Sabem também como oriento os meus amigos, quando solicitada, a melhor forma de lidar com os amores. Aqueles que perderam algum amor, não queiram entender os deuses, nem seus sortilégios. Entendam apenas que aqueles que morrem jovens no coração da gente, ficam eternamente jovens nesse mesmo coração. É o significado humano do sentimento e das sensações.

Para fazer justiça ao título, não irei pelo viés filosófico, falarei no popular: cuidado ao fazer o Bem. Talvez seja a indiferença à sorte do outro a melhor maneira de viver,quando se faz o Bem, só o reconhecem as pessoas do Bem e elas são poucas. Livrem-se de tudo que os levem a recordar ou despertar essa serpente malígna que guardamos um dia com afeto e metafóricamente a guardamos no fundo da gaveta da alma, livrem-se do lugar da memória: o retrato. As fotografias não te lembrarão dos momentos felizes e sim da traição, não a traição das pessoas, mas a traição do tempo que ficamos aprisionados por nada.

domingo, 26 de julho de 2009

Palavra


Palavra é substantivo sem sentido
Não sei dela o que retirar
Sempre que alguma coisa digo
Querem a palavra interpretar

Esse é um equívoco solene
Que sofre toda a população
Neste mundo, cheio de gente
A palavra não tem precisão

Mas deveria ter, sim como não
Um sentido único e uma só explicação
Para a palavra falar, com razão
E prescindir de uma tradução

Um dia ela vem como elogio
Outro dia torna-se palavrão
A mesma palavra, que castigo
Aparece em qualquer ocasião

Por isso falar é inútil
Nessa vida repleta de fel
Que o maior ignorante da terra
Destaca-se nessa Torre de Babel

Ele diz que o sentido foi outro
Quando a ofensa grave se apresenta
E fica ofendido de morte
Se a palavra a ofensa sustenta

As palavras podem ser usadas
Na poesia, no amor e na canção
Os seres humanos no entanto
Não as usam com exatidão

Fale o que quiser caro leitor
E deixe à pessoa o interpretar
Que ainda que Deus desça dos céus
A palavra outro rumo vai tomar

Impossível é prever e controlar
A maneira do outro agir e pensar
Que por mais que você seja claro
Suas palavras vão sempre mudar

De sentido é o que digo
De significado também
As palavras são tão inúteis, pense
É no silêncio que você fala bem

Com uma coreografia perfeita
As palavras põem se a dançar
E ainda que você se esforce
Jamais conseguirá se comunicar

sexta-feira, 24 de julho de 2009



Quer se dar bem na vida e não carregar o peso da rejeição ou do escárnio público? Mostre apenas uma metade de você. Faça suas aparições deixando uma metade oculta.

Sorria 50% - ninguém suporta gargalhadas histéricas
Coma 50% - o guloso é mal visto
Beba 50% - o álcool te desnuda
Conte de sua vida pregressa 50% - o passado passou
Fale de seus pais 50% - ninguém entende a família do outro
Confidencie ao melhor amigo 50% - talvez esse não seja seu amigo para sempre
Compre 50% - as dívidas são detestáveis
Gaste 50% - pode perder o prazer, guarde para ter prazer no gastar
Assanhe 50% - não dá boa impressão
Chore 50% - nada mais antipático que lágrimas infindas
Transe 100% - parcimonia com o número de parceiros
Grite 50% - e olhe lá, quem fala alto é evitado
Ironize 50% - as ironias podem ofender 100%
Critique 50% - guarde o deleite para si

Se conseguir atuar usando 30% de sua potência suas chances serão bem maiores. Seguindo esse conselho, pode não levar a melhor mas jamais a pior.

sábado, 18 de julho de 2009

Autonomia do sentimento: a inveja


Desconheço uma pessoa que não padeça desse mal: a inveja. Como qualquer outro sentimento a inveja também é autônoma, simplesmente a sentimos e ponto. O fenômeno que me impressiona é que as pessoas negam esse sentimento exatamente porque está catalogado entre os mais detestáveis. Como é comum escutar frases como "cuidado com a inveja"; "fulano é invejoso"; "as pessoas têm inveja de mim" e seu revés, "não tenho inveja de nínguem"; "nada me provoca a inveja"; "não sei que sentimento é esse".
Grande bobagem, palavras ao vento, a inveja está presente em todo ser humano, faz parte dessa gama de sentimentos que trazemos no nascimento e está prontinha para potencializar, é só pintar uma determinada situação que a maldita desperta de sua letargia.
A inveja é um sentimento sem um único rosto, é multifacetada. Aparece na forma de sorriso, de elogio, de ironia, de brincadeira, de piada, de maldade, de traição e até de assassinato. A inveja matou Caím.
Há como domá-la, como impedir sua manifestação. Basta enquadrá-la na área dos sentimentos que não podem atuar em hipótese alguma. Vale até uma Ave-maria, um Pai-Nosso e um Glória. Assim Deus se compadece e ajuda o invejoso a se recolher.
Mas a minha antipatia maior não é do invejoso, esse se consciente, está sob controle. Minha antipatia é dos eternos invejados. "Minha chefe tem inveja de mim, por isso me prejudica"; "meus colegas morrem de inveja de mim, só porque sou excelente no que faço"; "minha vizinha tem um olhar de inveja que até me benzo". Ai meu Santo! Que idéia agigantada de si próprio faz com que alguns idiotas se sintam invejados a todo tempo. Tem gente horrenda que se diz invejado, gente de inteligência mediana que se vê cercada pela inveja de todos, gente que nunca se destacou por um feito importante na vida, mas que a seus olhos todos invejam e queriam ser como elas, medíocres. Só pode ser isso. Pelo amor de Deus, além de lidar com a inveja ter que lidar com a vaidade e prepotência é uma dobradinha infernal para enfrentar. Só abatendo a tiro.
Já que a inveja existe vamos invejar o realmente invejável e dormir acalentados pelo belo e desalentados por não ter tido o privilégio de ser "o invejado". Ah, tem mais uma, inveja sem ação direta não prejudica nínguem, não impede que a gente vença. Basta de desculpas para a própria incompetência. Se a força dela fosse tão poderosa, os grandes cientistas, grandes artistas, grandes pensadores, não resitiriam para completar a obra. Estariam todos mortos. E as mulheres bonitas? Que Deus as proteja.

sábado, 11 de julho de 2009

Autonomia da imaginação arbitrária

Tudo começou em uma noite chuvosa. Parado à frente de uma loja de conveniência de meu bairro, vi um homem bem vestido, bonito e extremamente sério. Ao dia seguinte lá estava a criatura, mesma posição, semblante inexpressivo, fumava. E assim por vários dias sucessivos o quadro era o mesmo. Tinha uma cara ingênua e inofensiva, se é lícita essa expressão porque na verdade aquele rosto desconhecia o sorriso ou alguma simpatia. Aos poucos o homem da rua foi se transformando e deteriorando. A barba cresceu irregularmente, as olheiras tornaram-se negras e os cabelos foram se desgrenhando à moda pré-histórica, como se um vendaval tivesse como tarefa transformar o que um dia foi belo em um espectro humano. As roupas imundas, rasgadas sem deixar o mais leve vestígio de asseio. Tomou a aparência de um mendigo, mendigo não pedinte, sem cachorro. O animal de estimação me parece ser a única ligação afetiva das enigmáticas pessoas que moram na rua. Sua aparição noturna me intrigava até que uma manhã o vi no centro da cidade caminhando, depois o vi mais umas tantas vezes vagando pelas ruas de diferentes bairros, não era dado ao sedentarismo. Será que ele me via também? Confesso sentir certo medo no olhar apagado daquele homem. Sirvam esses detalhes apenas de introdução de uma estória que durou quase 2 anos. Em face disso que força tem a imaginação. Passei a pensar nele com mais frequencia que o necessário eu queria extrair daquela alma uma explicação de sua vida.

Há algum tempo tenho observado
Ao lado da casa onde moro
Um homem em silêncio parado
Olhar sem brilho, embaçado
Imagino sensibilizada, qual será seu fardo

Quando ali apareceu era um jovem bem trajado
Mas em seis meses a estranha criatura
Por alguma severa desventura
Aparentava apenas um velho alquebrado

Passava as noites de pé, em alerta
Como um soldado em guerra permanente
Terá ele uma ferida aberta no peito
Ou na alma uma questão pendente

Já ouviram falar em alma suspensa?
É algo como um gélido torpor
A respiração é falha e tensa
O corpo se retorce em dor

Talvez seja esse o caso do homem do lado
Imobilizado como se estivesse a pensar
Em algo do passado remoto ou recente
Que se tornou inquilino indesejado em sua mente

Pode ser a mãe, um filho, um irmão
Pode ser o dinheiro, a desgraça, a ruína
Pode ser uma mulher que o confinou a essa prisão
Pode ser a vida, de esperança já não tem a mínima

Homem da rua, homem sem expressão
Quem sabe eu possa lhe dar uma mão
Se seu problema for de ordem material
Fico feliz, de todos é o menos mal

Se perdeu um amigo e dele não se esquece
Acalme-se que o tempo lhe trará a serenidade
Volte ao mundo, mas não muito tarde
Seu amigo foi ali, não muito longe, espere
Passará com ele toda a eternidade

Se é por um filho que tanto se abate
Se a vida que leva não é o que você quer
Boa atitude não é imobilizar-se
Mas parar ao seu lado para o que der e vier

Se contraiu uma doença letal
E com ela não suporta conviver
Pense que não é um privilégio seu
Nascer, viver e morrer

Se já não tem a mulher que mais amou
Se a perdeu para outro ou foi desamor
Se quer a verdade te direi aqui na rua
Comece a contar lua por lua

Depois de dez ou vinte luas cheias
Virão as outras para seu tempo brilhar
Agüente firme, a guerra é dura,não se renda
Ela arrasa, fere, destrói, mas vai passar

Quando estiver livre desse tempo anódino e inodoro
Volte a ser como os outros, aparentemente sãos
Mas saberá que apesar de tudo
Experimentou o inferno, a prometida danação

Por tantas já passei e com conhecimento confesso
Da vida levo dores e grandes tormentos
Mas se a loucura não me fez sua prisioneira
Continuo andando e adeus lamentos.

sábado, 4 de julho de 2009

A autonomia do sentimento

Existem mentiras e mais mentiras mas a maior de todas é que sentimento se controla. Quem dera! Se nos fosse dada a fórmula de controlá-lo, grande parte das maldades do mundo desapareceriam. A única coisa que se pode fazer é impedir a manifestação externa dos sentimentos, bons ou ruíns, mas controlar a invasão dele nas horas mais inesperadas e impróprias, é inteiramente impossível. A questão não reside no amor ou no desamor,fomos agraciados com um sem número de sentimentos que entre o amor desvairado e o ódio assassino, perpassam a maldade, o despeito, a raiva, a inveja, o ódio, a vingança, enfim uma lista a ser engrossada a cada minuto pelo ineditismo do comportamento humano. É da nossa natureza, somos um poço de sentimentos autônomos de toda ordem e temos como dever de honra e ética não nos submetermos a eles, principalmente os espúrios. Só isso nos distingue dos animais.

Eu pergunto, existe coisa mais antipática e fora de propósito quando alguém nos diz..."perdoa, o ódio não leva a lugar nenhum", pura encenação de quem não tem envolvimento emocional com o fato. Posso, é do óbvio, não matar ou extravasar meus sentimentos além do limite da lei, mas deixar de sentí-lo, impossível.


quarta-feira, 1 de julho de 2009

Dor nos Pés...essa mata.

O Pisante Assassino

Vivia eu exilada nos Estados Unidos, quando recebi pelo correio um pacote do Brasil. Tomei-o em minhas mãos e galopei para dentro de casa com o intuito de sorver a sós o deleite de o abrir. Antes porém pratiquei uma tortura contra mim mesma, velho hábito que trago da infância, adiar a felicidade. Fui à cozinha, fiz um café, tomei, acendi um cigarro, liguei o som, tomei banho, troquei de roupa, passei batom, pus brincos de pérolas e um anel também de pérolas. Estava preparando-me para o solene momento que abriria aquele pacote, ele sobre a mesa não me dava uma pista do que era. Hoje sei, era um criminoso de periculosidade não catalogado nos arquivos policiais.

Inocentemente tomei-o em minhas mãos e o abracei com a ternura que se abraça um filho. Aquele embrulho azul cerúleo era para mim um pedacinho do céu de minha pátria, um alento conterrâneo para minha alma triste e saudosa. Ao som do Hino Nacional comecei a filar, à moda dos jogadores de cartas, cada dobra do tesouro que era meu, só meu, meu pacote do Brasil.

De repente sob meus olhos piscantes brilharam duas esculturas, cor da terra brasileira, sim, o mais formoso par de sapatos que já vira em minha surreal existência. Minha patriota menina do olhos quis chorar de alegria mas eu a impedi, detesto lágrimas.

Depois de todas as honrarias prestadas à dupla, lavei novamente os pés, passei cremes caros nessa base cansada, sentei na melhor poltrona da casa e os calçei, ainda ao som do Hino Nacional. Que prazer, que sensação de bem-estar, o presente parecia feito da mais pura seda e ainda por cima exalava um perfume campestre. Eu os admirava a tal ponto que a dado momento, já desvairada de felicidade batizei-os com o nome do grande viajante desdobrado em dois: Marco e Pólo.

Pensei, vou sair, vou passear com Marco e Pólo. Pintei a cara para melhorar a estampa, puxei fortemente os cabelos para trás com o fim de esticar um pouco o rosto, passei perfume e com um pedaço de veludo lustrei delicadamente Marco, repeti o ritual em Pólo e saímos à exibição pública. Aquele dia era meu como se fosse o dia de meu aniversário, tudo estava a meu favor, a temperatura alta, uma leve brisa me dava guarida, as flores sorridentes se viravam para olhar a dupla, as árvores se faziam tendas para nos dar a sombra, alguns carros paravam e seus ocupantes me olhavam estupefatos, eu já não andava eu voava, eu era a mulher mais invejada da cidade, os homens e a natureza finalmente reconheceram meus encantos.

Marco e Pólo eram os responsáveis pela minha passagem, do anonimato total eu me tornava uma estrela. Sobre meus passarinhos que garantiam a leveza do meu andar, os ouvia pipilar a cada passo, eu desfilava pelos mais movimentados pontos da cidade.

Mas para pagar tributo ao velho chavão, a alegria de pobre dura pouco, aliás não dura nada. Um homem com cara de riso, com o olhar fixo em Marco e Pólo deu me um aceno com a mão, eu não o conhecia mas ensaiei um sorriso delicado ao admirador. Em seguida uma criança levada pela mão do pai apontou para os meninos que eu calçava. O pai, um insensível, puxou-lhe rapidamente e pediu ao inocente de gosto apurado a discrição de um adulto. Que bruto!

E lá ia eu com minhas maravilhas deslizantes pelo mundo quando um homem de aspecto fracassado me olhando urrou: sangue!...Continuei impoluta no meu desfile quando escutei outro grito de alerta, dessa vez como relincho: sangue!... Pensei que pudesse ter havido algum acidente por perto e as pessoas estariam prevenindo às outras pelos possíveis sustos. Até que um impertinente aproximou-se e disse me cara a cara: “moça seus pés estão ensanguentados”.

Pensava que o amor só era cego, hoje sei que o bandido é também indolor e insensível. Baixei subitamente os olhos e não vi nada, virei a cabeça lentamente para trás e flexionei a perna esquerda também para trás, repeti o movimento com a perna direita e a verdade esbofeteou-me o rosto. Meus tornozelos estavam no osso, era sangue que jorrava prá todo lado, não havia mais a pele, nem aquela carne magra que reveste esse ponto do corpo resistiram à fúria de Marco e Pólo, os atacantes.
Voltei para casa arrasada em lágrimas, traição igual só conhecia no gênero masculino, em sapatos, não. Eu os queria matar, lentamente, na tortura. Arranquei os amaldiçoados dos pés e os arremessei contra a parede sem dó, sem lástima.

Esbravejava e os ofendia como se fossem gente e não seres inanimados, afinal gente é que fere sem razão. No entanto estava perante uma exceção. Pensei...vou vender esse par de canalhas. Já que comigo não se adaptaram, quem sabe podem sentir-se melhor em outros pés. Ao par disso poderia obter algum lucro, o que não seria de todo um mal. Foi assim que começou a saga dos pisantes assassinos.

Depois de fazer curativos nos aleijões em que se transformaram meus pézinhos e tomar remédios contra ferimentos graves, coloquei os perigosos na caixa e rumei para a casa de uma amiga que hospedava umas parentes há quase um mês, quem sabe ali me veria livre de Marco e Pólo. Ah, há um detalhe que me esqueci de mencionar, o modelito da dupla. O bico dos ignóbeis era furado à moda dos anos 60, tinham também uma alça no peito do pé que lhes dava uma graça infinda. O salto era grosso, firme e elegante.

Chegando à casa da anfitriã de visitas odiadas no exterior, uma das hóspedes enlouqueceu com a beleza dos irresponsáveis, antes que eu fizesse qualquer objeção ou recomendação ela os enfiou pé afora enquanto seu desavisado dedão escorregava para dentro da máscara mortuária e se encaixava na abertura da frente. De repente começaram os gritos desesperados da hóspede-menina: socorro, tira, tira pelo amor de Deus. Sentada no chão ela blasfemava tentando tirar Pólo de um pé que apertou seu dedão de tal forma que ele imediatamente inchou e arroxeou. Enquanto a ajudávamos Marco se incumbia de fazer sua parte. Na minha cabeça a gangrena era certa. Lutamos bravamente contra os dois, eu puxava o corpo da possuída e minha amiga os assassinos. Quando a liberamos, o impacto foi tão grande que fui parar com as costas em uma parede e minha ex-amiga na da frente, uma violência. Marco e Pólo mais uma vez festejaram a vitória.

Sai dali desagradada, sem convites para ficar mais um pouquinho, mas já pensando em outra vítima. Lembrei-me de uma colega chinesa que aparentemente gostava muito de mim. Seus pés eram fininhos e delicados, naturalmente os sapatos não teriam como fazer-lhe mal. Essa filha de Mao Tse Tung por certo os compraria, eu já obsevara que longe dos olhos do Partido, ela se deleitava nos prazeres do consumismo capitalista desenfreado. Quando lhe mostrei o inocente par de sapatos, seus olhos puxados desempuxaram-se, aquele era um objeto precioso, duplamente importado, do Brasil para os Estados Unidos e no futuro para Pequim. Comprou-os sem pestanejar. Cinqüenta dólares. Os agradecimentos foram de tal ordem, que sentia-me previamente culpada só de imaginar o espírito perverso de Marco e Pólo voltando à carga e dessa vez a guerra seria ideológica. Não deu outra.

Quando sai da biblioteca vi Turikita rodeada de patrícios que falavam e gesticulavam como se tramassem uma retaliação ao sabor amarelo. Foi só pôr os olhos em mim que a "vermelha" pouco convicta miou, Luchiiiiiiiiiiiiiiiinha (meu nome é Lúcia mas Turikita não pronuncia bem o C e eterniza a sílaba tônica,) que “iiiiiiiisho”? Eu quis fugir mas amedrontada por uma possível perseguição amarela, a atendi. Meu Deus do céu que estrago, lamentei. Ela, implacável, com os pés franzidinhos horizontalmente, vociferava, “where is my money?”.

Dessa vez achei que Marco e Pólo fizeram bem, afinal, aquele não podia ser o comportamento de uma chinesa maoísta que se prezasse. Indiferente à dor lascinante que sentia, ela só queria saber do dinheiro. Eu também, mas comunista não sou, logo posso ter uma certa ternura pelo escasso vil metal. Devolvi a ela “meu dinheiro” e me mandei sob ameaças da furiosa turba oriental; os delinquentes dentro da caixa.

Depois de tanto sofrimento e já resolvida a pôr fogo no detestável presente, encontro-me com uma brasileira conhecida por sua personalidade invejosa, ela queria tudo dos outros, inclusive os maridos. O meu infelizmente ela não quis, nem tudo eram flores naquelas plagas. Quando viu a caixa perguntou de cara, que isso? Um par de sapatos do Brasil, estão grandes para mim, quer comprá-los? Falei com doçura. Supitando ela abriu a caixa e com um sonoro suspiro de admiração pagou-me os cem dólares (aumentei o preço) e saiu saltitante, em lua de mel com sua nova aquisição.

Ao dia seguinte quando passei de ônibus por uma rua calma de minha vizinhança vi uma moça agarrada em um poste. As pernas estavam trançadas e trêmulas, estranha visão. Quando subi meu olhar a seu rosto, reconheci a tal brasileira invejosa. Pagou caro pela inveja. Seu rosto estava inteiramente desfigurado, os olhos azarolhados, a boca tomou o formato de um O, coisa do outro mundo e a cabeça girava com uma rapidez impressionante, parecia um pai de santo em sua melhor perfomance. Quando baixei meu olhar para o chão vi que ela estava com um pé em ponta e o outro dobrado para fora.
Apavorada desci do ônibus e reconheci Marco e Pólo atacando outra vez.... Ela só me lançou seu olhar vesgo e gemeu:"bandida".

Essa é a estória de um par de sapatos, assassinos da base. Hoje depois de julgados e condenados, esses malditos pisantes jazem enforcados no galho de uma frondosa árvore no interior dos Estados Unidos. Torná-los inacessíveis foi a única forma de impedir que o espírito de “serial killer” continuasse inutilizando os pés femininos.

Não sei o porquê da fascinação das mulheres por sapatos, acho mesmo que seja algo do gênero feminino, padecemos dessa obsessão e assunto encerrado.

Pois bem, contei esse drama para que todos saibam o que pode acontecer por amor: eu sentia um amor verdadeiro por sapatos. Era aquele tipo de amor raro, imotivado, sincero, fiel e subserviente. Tenho certeza que foram os sapatos os grandes amores de minha vida. Sempre que os via nas vitrines, reverenciava-os como a um ser superior. Sapatos para mim tinham alma e coração...macabra crença. Essa dor eu guardo no peito.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

A maldição da fama




Há alguns dias tenho sentido o coração apertado e logo me dou conta que tem a ver com a partida de Michael Jackson, ele era o máximo, carregou a fama desde a mais tenra idade, um verdadeiro fenômeno. Famosos são aqueles que por alguma razão muito peculiar se destacam entre os demais. Foi o caso. Sua singularidade foi muito além do comum. Admirá-lo ou não, não faz a mais minima diferença, o mundo o admira, o celebra. Esse dado não se discute.

Há os famosos pela maldade, em geral pouco citados, ou citados para exemplificar a encarnação do mal sem limites, cito Hitler, uma fera no meios dos homens, carregará a má fama pela eternidade com o lugar assegurado no inferno.

Michael Jackson era um famoso, um artista, voz suave,dançarino, compositor, filantropo, humanitário e outras qualidades que as pessoas chegadas a ele não se esquivam em testemunhar. Dizem que era pedófilo, não sei. Com certeza sabemos que ele era inequivocamente um artista, nada mais.

Quando ele entrava no palco, não tinha para mais ninguém, o cara arrebentava, dançava seu moonwalker, influenciando toda uma geração, cantava músicas belíssimas de sua composição, sensibilidade a toda prova. Ultrapassou o muro odioso construído pelos brancos para impedir a entrada dos negros. A música foi sua arma. Letal.

Mas....e a fama do outro? Quem suporta? Quem convive bem com a própria mediocridade? Quem? Muita gente, milhões de pessoas, a grande maioria, não há saída, ou bem reconhecem o valor do outro mesmo sem gostar ou se expõem fazendo críticas desprovidas de embasamento técnico. Michael jackson foi genial.

Por esses dias em que a mídia está em alvoroço com uma matéria "das boas" para preencher seus espaços e substituir suas colunas e apresentações televisivas insuportáveis, Michael Jackson tem sido apresentado de forma vergonhosamente desrespeitosa. (nem sei se a palavra "respeito" tem algum significado)

Gostaria de saber qual é a credencial que certos jornalistas têm para se dar ao direito de falar e vilipendiar uma criatura em sua aparência física, comportamento, maneira de viver e outras coisas mais como estamos assistindo na TV e lendo nos jornais e revistas. Digamos que nenhum deles como o antipático grupo do Manhattan Connection, primou pela beleza, inteligência ou o conhecimento da alma humana. O tal do Diogo Mainardi, um chato sem similar na estória do jornalismo, devia se aposentar por invalidez mental. Figura mais agressiva e estúpida, nesse mundo, se há, eu nunca vi. E o pior...tem platéia, seus sequazes acham a maior graça nos comentários mordazes e implacáveis que faz a qualquer um que tenha alguma fama. Para esse senhor não existe a comiseração, o respeito humano, a possibilidade de redenção do homem. É um entendido do nada. Mais que falar, Mainardi pontifica sem lastro técnico sobre qualquer tema. No caso em questão, será que ele entende mais de música que todos os profissionais do ramo que não se furtaram em fazer os maiores elogios a Michael Jackson? Ah seu Mainardi se tudo que a gente pensa pudesse ser dito como é de sua prática, o senhor escutaria umas tantas.

O fato é que indiscutivelmente Michael Jackson foi uma das grandes personalidades da música pop do século XX. Fala-se muito de seus problemas de outra natureza, mas a justiça americana que não perdoa ninguém não o condenou. Se teve um comportamento excêntrico, fora dos padrões impostos pela cultura, soube também deixar sua marca, sua música e seu talento para a posteridade.

Lamentavelmente Michael Jackson morreu e com ele levou os segredos e os porquês o fizeram ser tão diferente, tão copiado e tão querido. Como dizia o finado jornalista Ibraim Sued,terrível lançador de farpas a elementos que lhe eram desafectos na sociedade carioca, "os cães ladram e a caravana passa". Isso ele dizia bem, doravante o copiarei.

domingo, 28 de junho de 2009

VOAR, VOAR E VOAR.....















.



Voar é coisa de pássaro,
Mas não sei por qual milagre eu voei,
Aqueles que me julgam e condenam,
Um sorriso de olhos lhes deixei.
De mim não guardem lembranças,
Nem pequenas saudades ou até temor.

Na vida tudo vem e tudo passa,
Menos o desterro do amor.
Tal exílio não é para outras terras,
No corpo o amor tenho guardado.

Ainda que um dia alguém o clame,
Não me solte vento nesse mundo
Só me entregue depois de libertado
No íntimo contacto com o infinito.

O vento içou suas velas e me levou,
Voava minh' alma pelo espaço,
Enquanto na terra meu último grito,
O zéfiro o varreu e o apagou.

Voar é coisa de pássaro,
Mas não sei por qual milagre eu voei.
Voei e lá do alto bem alto
Em nuvem me transformei.





sábado, 27 de junho de 2009

O silêncio: arma infalível






Em qualquer situação que te encontrares, nunca se esqueça que o silêncio é o discurso mais eloquente. Isso foi dito por um filósofo, a êles devemos os mais sábios aforismos.

Lembro-me de uma situação muito difícil que passei há algum tempo. O terrível é que estava sózinha e não tinha com quem compartilhar aquilo tudo que estava vivendo. Pensei, está tudo perdido, sem conselhos e opiniões fico sem ação, não sei que caminho tomar. A coisa era de tal forma devastadora que entrei em uma igreja, precisava de um interlocutor. Encontrei, era um interlocutor silencioso e eu de minha parte também silenciosa. Esse foi o maior e mais importante diálogo de minha vida.

Quando estou em silêncio posso pensar sem limites, quando falo também posso falar sem limites, mas nem tudo que penso posso dizer. O silêncio é minha zona protegida, é minha zona de segurança, sempre que a ultrapasso, estou em perigo.

Atenção: se você quiser ter uma visão limpa, cristalina de suas experiências, busque no universo infinito do silêncio a resposta. Você a terá. Nas relações amorosas o silêncio te traz mais benefícios que qualquer fala, ainda que essa seja inteligente. Tarefa difícil mas não impossivel. Tente. Afinal, a arma é infalível porque está apontada para você e acerta.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Do Passado

Se pudessemos dar nomes daria mas como não posso darei letras.

Para A.

Queria ser você por uma hora
O tempo, você sabe qual foi
Dentro de você eu saberia
Que a aquilo que eu chamava de aurora
Da vida, era um sonho
Dentro de você eu já morria.

Tudo ficaria claro, que dúvida
Tanto tempo eu não desperdiçaria
Sonhando com seu riso de pilhéria
Que cega pela paixão eu só queria
Ter você a vida inteira, que ironia
Se eu pudesse rasgava a fantasia

Foi um dia azul de luz intensa
Que bem ali você me apareceu
e por uma questão do meu destino
fui ingenua, mas certa do que sentia
declarei a você o meu amor, que loucura
nem seu rosto direito eu conhecia

Com o tempo o sentimento tomou rumo
Fora do controle de minha alma em sangria
se chorei eu não sei mais quantas vezes
mas de todas as lágrimas caídas
sinto que ainda apesar do tempo longe
tem uma que não suporta a despedida.

“Aprendi com as primaveras a me deixar cortar para poder voltar inteira." Cecília Meirelles

Sempre fui um intrigada com a mente humana. Desde a mais tenra idade ficava impressionada com a imprevisibilidade das pessoas que me rodeavam. A mesma brincadeira podia ser motivo de risos incontroláveis ou de surras inesquecíveis. Eu era invocada com aquela estória de gente ter mau humor, eu era a exceção, estava sempre bem humorada e feliz. Observava mudanças tão súbitas nas pessoas que criei uma categoria específica para os adultos: “gente esquisita”.Quando cresci e virei gente grande percebi que engrossei as fileiras das “gente esquisita”. Acho que hoje sou o campeã de esquisitisses.

Ainda naquele tempo, por incrível que possa parecer, eu me preocupava com o que eu seria crescesse. Tinha medo de não ter um único lugar na terra onde eu pudesse ser aproveitada para trabalhar. Lembro-me de passar noites inteiras acordada me imaginando um nada, uma sem sorte, uma miserável. Até que superei meu drama de criança ansiosa, escolhi minha profissão, eu seria mendiga. Chegava a ensaiar um olhar que sensibilizaria uma estátua para pedir um pedaço de pão. Resolvi que mudaria de cidade viveria pelas ruas aos trapos, andaria pelo mundo, pedindo esmolas e contando às pessoas minhas desditas. Eu não queria amores, via gente grande chorar por causa dos amores perdidos, não teria filhos, vi minha vizinha chorar quando perdeu um entre seus dezesseis filhos, não queria casa, tinha que pintá-la de dois em dois anos, não queria contas, elas brotavam todo mês, sempre achei que deveriam acompanhar as estações do ano, uma a cada 3 meses. Era isso, estava decidida, eu seria um pão velho, esse era o nome que dávamos aos infelizes pedintes que tocavam a nossa porta. A fantasia era tão real que chegava a ter pena da inocência de meus pais pagando escola para mim, eles não sabiam, eu já escolhera minha profissão, mendiga por vocação.

As reminiscências de um tempo em que todos os dias foram domingos de sol me fazem rir. O que passa na cabeça de uma criança é coisa do outro mundo, não? Não. O que passa na cada cabeça de qualquer um 'e coisa do outro mundo, coisas inacreditáveis. Dizem que a criatividade humana é infinita, vejo isso com uma certa apreensão. Há quem veja como a mágica da vida. Cada um com seu cada qual, belo e triste ditado.Cada um tem seu próprio dialeto, no mundo há tantos dialetos quanto o número de habitantes. Há escolas para ensinar todas as línguas, exceto o idioma da alma. Esse é indecifrável, jamais o dominaremos.

Não sei porque fui cair no buraco da mente, pensar, que castigo. Não sei porque não segui minha nobre vocação de mendigo, sei que ainda posso ser um mendigo de sucesso mas sou covarde, não tenho coragem, não tenho força para dar um adeus para sempre a tido que sei da vida e cair na ausência de memória. Descobri uma coisa nova em mim. Sou artista, estou sempre fingindo não me horrorizar, mas como meus amigos não sabem que sou a senhora dessas letras, eu horrorizo e confesso que temo pela perda de controle e o esganamento até a morte de qualquer um deles. Meu Deus, quanto absurdo, quanto ódio, quanta inveja, tudo isso me é contado e eu escuto sem expressões faciais ou orais que traduzam meu enorme desprezo pela humanidade.

Percebo que nos diálogos que me são reproduzidos as pessoas nunca dizem às outras a verdade, a enganação e ocultação é a ordem do dia. Estou tão abismada com o cinismo mundial, que outro dia quase esbofeteei a cara de um colega que me desferiu um falso elogio, disse- me o sacana que eu estava linda para minha idade. Lógico que é mentira, sei que ele pensou, essa mulher virou um espectro, um marmota, mas como todos, falou exatamente o contrário.

Se meu padecimento fosse só por saber da vida de meus conhecidos estaria bem. Utilizaria o princípio da não generalização e atribuiria só a esse pequeno grupo essa malignidade por nascimento, pensaria, aqui está concentrado o mal da humanidade, dei azar. No entanto cada pessoa se desdobra em mais de 100 pessoas pelo menos e eu passei a odiá-las todas. Só me compadeço daqueles que cultivam a baixa auto-estima, considero uma enfermidade quase incurável, mas nutro um ódio sem fronteiras pelos que se aproveitam desses e tripudiam. Como pode ver, paciente leitor, estou à beira de um colapso nervoso. Vou relatar o caso que me trouxe à prisão e vocês julgarão se essa sentença foi justa ou não. Antes porém darei o meu ponto de vista. Como estou pela minha alta periculosidade em uma solitária, acho-a justa e para mim de grande benefício. Espero que no dia da libertação não ver nunca mais um rosto humano. Dispenso os espelhos mas não possuo a faculdade de dispensar a memória, essa é minha verdadeira prisão.

Não suportar a idéia da realidade que me foi imposta é destituir de significado o sofrimento que a acompanhou. Isso para mim é pior do que o fim do próprio sofrimento. Eu não tenho mais dúvida que toda a degradação moral e emocional que tenho vivido, tem se convertido lentamente em uma ascensão espiritual, em razão disto, aceito o que me foi tão asperamente impingido senão seria o mesmo que não tê-lo vivido. Agora quase 3 dias depois, eu assumo perante a mim mesmo uma humildade que se por um lado ela é silenciosa, por outro lado ela tem uma cara que quero conservá-la.

O mundo continua sua rota, algumas pessoas podem sofrer sem serem drasticamente importunadas. Isso não sucedeu comigo. Todas as intempéries que bateram à minha porta, eu as deixei entrar, amigos e inimigos encontraram o caminho desempedido e entraram. Aqui eles vieram e com ou sem piedade fizeram de mim a depositária de suas desventuras, de seus infortúnios, de suas próprias tragédias. Eu represento para todos, e disso não tenho dúvida, aquele traste que mais uma ou menos uma já não faz a mais mínima diferença. Meu sofrimento já é um patrimônio que, acredito, ninguem o aceitará como herança.

Pela primeira vez eu reconheci o mensageiro da morte que me entregou uma mensagem e partiu. Parece melodramático, não? Mas foi como me senti. Deixada completamente só de tudo que me pudesse consolar, tive que suportar a quase irresistível dor da perda.

Minha tristeza foi algo tão inenarrável que ao me ver frente ao espelho pouco depois de sua saída, foi o mesmo que ver um sudário estendido. Se essa não fôsse apenas uma analogia suave do que sentia, mas a realidade, com certeza eu estaria melhor. Meu mal era uma espécie de nevoeiro na cabeça que nem os médicos nem os padres podiam curá-lo. O esfôrço para minorar a dor da apunhalada servia apenas para aumentá-la e ao mesmo tempo abrir em minha alma um abismo vago apenas preenchido pela irrespondível questão: Por que êle fêz isso? Sem resposta eu sentia meu corpo cair prostrado, inerte, agonizando internamente enquanto as lágrimas desciam pelo meu rosto como um rio que leva todas as riquezas de seu leito. Ao lado disso a intensa dor: ele não me ama mais. Não, ele nunca amou. No entanto, isso era só o comêço.

Nos dias que se seguiam, a coisa apenas piorou .O mundo tormu-se para mim a configuração do estático, tudo perdeu o movimento, até os objetos em seus lugares eternos se tornaram olhos abertos para cinicamente contemplar a minha dor.

Eu sempre soube que por êle tive um sentimento puro, daqueles que não se embaraçam com dúvidas, que se conservam porque são raros. A dor da perda foi infinitamente maior que a felicidade que tinha ao pensar que o possuía. Se me fosse dado o direito de reverter o tempo eu abriria mão da felicidade que tive com ele para não confrontar a dor de sua partida. Por ele eu tive a mais intensa e extensa paixão.
Foi em uma noite como outra qualquer que ele chegou mais tarde que o usual com um sorriso afivelado na boca. Meu coração, antecipando o golpe, batia como o sino da igreja, algo me ia ser anunciado, maldita epifanía Seu olhar mergulhado no nada denunciava placidamente aquilo que lhe ia na alma. Maldito momento, era a declaração da minha guerra particular, meu pequeno Vietnam. Ele tinha outra.

O choque da frase dita por ele caiu em meu espírito como bala de chumbo no alumínio. Em sua fala estava contida todas as delícias das execráveis ironias do desprezo triunfante. Talvez fosse a lembrança da outra que lhe ressurgia seguida de atrações vertiginosas ao ponto de perder a altivez e lançar em minha cara a felicidade de se ver livre de mim. Ele exibia para mim, o que até agora me dói relembrar: a monotonia da retórica do adeus, sempre da mesma forma, sempre atenuada por elogios infrutíferos para revestir a saída com a soberba de quem está por cima. Ele que me parecia um homem de muitos paixões não soube detectar a dessemelhança de sentimentos sob a igualdade das expressões. Devo ter dito coisas pesadas, não sei, mas sei que em relação a ele, tive sentimentos nobres, muito nobres.

Eu sei que usou a medida que considerava certa. É com certeza também que eu sei que não conseguiu controlar o exagero do que sentia para reter na mão os mísseis que me atirava. Talvez ele não tenha conhecimento do efeito detonador de cada gesto, palavra e até mesmo olhar. Ele tinha outra.

Fui à sala, sentei-me no sofá, e então a ternura dos dias passados voltava em meu coração. Eram lembranças das frases poéticas que me foram ditas um dia, mas que apareciam intercaladas com pensamentos imprecisos, nostalgia do passado, e um terrível pavor pelo que ainda estava por vir. Eu já previa o que estava por vir. Veio.

Comecei a rezar, com a esperança de que do céu descesse uma resolução divina; e, para atrair a comiseração de Deus prometia o incumprivel. Nada porém silenciava o lamento interno e a febre que tomava conta de meu corpo, provocando um incomodo que nenhuma morfina seria capaz de acalmar. De desesperada eu me via apoplética, bombardeada pela terrível notícia que para ele saiu da maneira tão tranquila. Eu pasmada pela apunhalada mais profunda que me foi tão implacavelmente desferida. Ele tinha outra.

O amor que lhe dediquei foi colocado ao lado dos trastes que não queremos mais. Pouco a pouco eu me tornei a protagonista do escárnio, das pilhérias, da vingança, dos ódios das pessoas. Tenho também a conciência do quão irresponsável é o comprometimento amoroso. Eu posso ter clareza que a passividade, a tranquilidade de um não tem nada a ver com o inferno do outro. Nada mais conta. Eu me dei conta que o desrespeito de uma criatura pela outra se localiza no patamar do que de mais hediondo há na natureza humana. Nietzche dizia que quando a casa está em chamas até de comer se esquece. Mas depois come-se sobre as cinzas. É o que estou fazendo.

Hoje eu me sinto a vontade para bradar do alto das montanhas todo o sentimento que dividi com ele, ou melhor, comigo mesmo. Agora só me resta uma coisa: a resignação. Eu perdi e está perdido.

No entanto, não posso agora deixá-lo partir carregando no peito qualquer culpa por ter descolorido minha vida, pelo menos por algum tempo. Estou convicta de que fui eu mesma que a destruí. Eu deixei de ser a controladora de minha alma. Ninguém por grande ou pequeno que seja pode se perder a não ser por meio de suas próprias mãos. Por pior que seja o que o mundo me fez, mais terrível foi ainda o que fiz a mim própria. Eu gostei mais do outro que de mim, grande êrro.

No fim, depois de tudo, "se assim foi é porque assim é que tinha de ser, se assim o foi". (Guimarães Rosa)

Outra revelação:
Já não me lembro de seu nome.
Já não me lembro de sua fisionomia.
Já não escuto sua voz.
Será que fui eu que vivi aquela via crucis? Acho que não.

Isso que segue abaixo pode ser aplicado a qualquer objeto de nosso amor, não há um só destino, são vários. Recomeçaria tudo outra vez....com o novo eleito.

PARA QUE SEJAMOS NECESSÁRIOS

Transfere de ti para mim essa dor de cabeça, esse desejo, essa violência
Que careça em ti o meu excesso e que falte o que tu tens de sobra
Que em mim perdure o que te morre cedo e que permaneça o que tenho perdido.
Que cresça, se desenvolva um teu sentido que em mim desapareça.
Dá-me o que possuir tu o que não te importas
E eu multiplico o que te falta e em mim existe para que nosso encaixe forme uma unidade – indivisível que não se possa subtrair uma metade.

Bruna Lombardi
No Ritmo dessa Festa